E você, sabe a diferença entre 15 centímetros e 1,5 metro?
Existem duas falácias que costumo ouvir sobre o artigo 201 do Código de Trânsito e a aplicação de multas. O Artigo 201 diz que, ao ultrapassar uma bicicleta, o motorista deve reduzir a velocidade e manter distância mínima de 1,5 metro do ciclista. O desrespeito a essa lei pode, facilmente, levar à morte do ciclista. Se você acompanha minimamente o assunto, já deve ter ouvido, ao menos, uma delas. Resolvi escrever esse post pois encontrei AMBAS em um mesmo artigo do UOL Notícias. Primeiro, um pouco de contexto.
Das 6,9 milhões de multas emitidas em São Paulo em 2010, 82% se enquadravam em 5 tipos: rodízio, excesso de velocidade, estacionamento proibido, telefone celular e avanço de semáforo vermelho. Nesse contexto, só 3 motoristas foram autuados sob o artigo 201. Além das razões falaciosas de que vou tratar já já, outro motivo fica claro: 62% das multas são dadas por equipamentos eletrônicos.
Mas vamos às duas justificativas. A primeira desculpa é dada pela CET, na matéria do UOL:
Em nota, a CET afirmou que a fiscalização ao artigo 201 “é prejudicada pela dificuldade de se verificar a distância mínima de 1,5 metro entre veículos motorizados e bicicleta”. Por conta disso, diz o órgão, “o volume de multas dessa infração é baixo”.Leitor, faça-me um favor. Estique seu braço. Dependendo da sua altura, a medida será entre 60 e 80 centímetros. Agora imagine que existe outro braço na ponta do seu, com a mesma medida. A não ser que você seja uma pessoa bem alta, é provável que os dois braços juntos não cheguem a 1,5 metro. Ou seja, só de olhar para o ciclista dá pra sacar se o veículo está passando a uma distância menor do que a proposta: basta imaginar que ele está de braços abertos. Por sinal, é o que eu sempre levo em conta. Se eu conseguir tocar num carro, ele está perto demais.
Foi o que aconteceu ontem comigo, quando um motorista cruzou 3 faixas para fazer uma conversão à direita e me fechou. Mas, como já tenho alguma experiência, pude prever o movimento e me resguardar – não sem antes dar um tapa no porta-malas, para que ele entendesse quão perto passou.
Pode parecer arbitrário, mas 1,5 metros não é um número qualquer. Todos nós temos a capacidade de avaliar objetos e imaginar o tamanho que eles têm. Você, com certeza, sabe a diferença entre algo que está ao alcance das suas mãos (60 a 80 centímetros) e algo que não está. Um metro e meio é uma medida que facilita a autuação. E nenhum ciclista pede que sejam multados os carros que passem a 1,38 metros. Mas aqueles que tiram as finas educativas, ou passem a menos de 1 metro. A imagem deste post é bem clara: você acha que o motorista está ou não passando a 1,5 metro do ciclista?
Quanto à segunda desculpa, quem explica é Capitão Paulo Oliveira, em nome Comando de Policiamento de Trânsito (CPTran) da Polícia Militar, na mesma matéria do UOL:
“A estrutura da maioria das vias não permite que os veículos mantenham a distância de 1,5 metro da bicicleta. Devido à falta de espaço, restringe-se a a aplicação de reprimenda administrativa”
Chega a ser risível esse motivo. Se a estrutura da via não permite que a bicicleta seja ultrapassada com segurança, ela não deve ser ultrapassada. Simples assim. Esqueçamos que estamos falando de uma bicicleta por um instante. Se fosse um automóvel na sua frente, você não o ultrapassaria, porque ele está na sua frente, ocupando a faixa. A bike ocupa a faixa, e tem direito a estar lá tanto quanto o automóvel. Aí você pode argumentar que a bicicleta é muito lenta, numa subida, por exemplo. Então imagine que é um caminhão que está subindo, e ele está carregado. Você não vai passar por ele sem segurança. Mas, como falamos de uma bike, um veículo frágil, em última instância, basta jogar o carro pra cima, que o ciclista desvia, não é?
Faz bastante tempo que eu ouço esses pseudomotivos para a CET não multar. Acho que está claro, nesse post, que são apenas desculpas. O ponto principal, no entanto, é outro: mais do que uma questão de respeitar a legislação, o importante é respeitar a vida. Não importa a distância exata, o número, a régua. Importa ultrapassar sempre com segurança. Importa lembrar sempre que a bicicleta não é um brinquedo, não é um obstáculo. É um veículo e leva, antes de qualquer coisa, uma vida. Simples, não?
fonte: www.nossoquintal.org